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domingo, 6 de dezembro de 2015

Gustavo Aguiar e Marcos Vinícios Pereira de Almeida - Manifesto Contra a Crise de Legitimidade dos Direitos Humanos e das Democracias Ocidentais: Uma Crítica à Dogmática Pós-Moderna

por Marcos Vinicios Pereira de Almeida e Gustavo Aguiar Marinho



"Tolerância e apatia são as últimas 'virtudes' de uma sociedade moribunda". - Aristóteles.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente estudo tem por objetivo preencher a lacuna deixada pelo status quo vigente, com inteligibilidade de ínclitos pensadores, vivos ou mortos. Iremos explanar, por meio da iluminação platônica ou husserliana (entendida aqui, metaforicamente), os problemas centrais da democracia, dos direitos humanos e da racionalidade prática da modernidade caída. 
Ademais, direta ou indiretamente, os problemas centrais nesses temas sempre estão relacionados aos conceitos de 'universalidade', 'neutralidade', 'igualdade', 'vontade' e 'razão', a saber: os conceitos abstratos que fundamentam as ações beligerantes do imperialismo contemporâneo. Destarte, autores como Alain de Benoist, Aleksandr Dugin, Alasdair MacIntyre, Slavoj Žižek, René Guénon, Julius Evola, dentre outros, trabalharam incessantemente, tanto aprioristicamente quanto na práxis, em combater tais abstrações inúteis. 
No limiar do Kali Yuga (Guénon e Savitri Devi), ou mesmo na decadência que tem como resultado; premissas compostas por simulacros de moralidade (MacIntyre), onde o dominador falseia a realidade ao seu interesse (Žižek), teremos como proposta, a superação dos paradigmas modernos (Aleksandr Dugin). Destarte, o estudo é além de tudo uma ação de contribuição teleológica para um fim em comum na luta contra o mundo moderno. 
A PROPÓSITO DOS DIREITOS HUMANOS

1. Genealogia do indivíduo 
É impossível falar de direitos humanos sem mencionar o nascimento do indivíduo. E, para entendermos melhor os fundamentos teológicos e filosóficos do indivíduo, me valerei de partes da obra Para Além dos Direitos Humanos de Alain de Benoist, onde há uma genealogia clara da individualidade ao longo da história, em seu desenvolvimento filosófico e metafísico ao ponto culminante na modernidade.
Ademais, o cristianismo, segundo De Benoist, difere de outras religiões europeias em muitos aspectos, mas a diferença substancialmente relevante nessa genealogia pertine à concepção de salvação, e no fato de que tal salvação possui natureza individual. A ideia de um Deus único, regente a todos, pressupõe uma comunidade universal e igualitária. Santo Agostinho foi muito importante para a fundamentação desse princípio de salvação individual, no que concerne à sistematização teológica: de que a via de acesso entre o homem e Deus acontece por meio da interioridade; ou seja, a importância da interioridade é indispensável para a compreensão do cristianismo e das tradições filosóficas futuras, como o cartesianismo. (1) 
Outro aspecto importante nessa mudança filosófica é o conceito de amor (ágape) no cristianismo. Essa mudança no conceito (pretensamente universal), foi um enquadramento, por assim dizer, no sentido da "tomada do cosmo" (se é que nos permitem esse termo) do que já está no mundo. "O ágape - continua Alain de Benoist - já anuncia a ideia moderna de Benevolência: todos os seres humanos devem ser tratados com um respeito igual ao que sua dignidade lhe dá direito" (De Benoist, Alain, pag. 22). Portanto, essa mudança radical na compreensão do amor irá afetar bastante a ética moderna na sua busca incessante de afirmação duma moral, desde Kant a John Rawls. (2) 
O cristianismo, como religião universal de uma comunidade que engloba toda a humanidade, não tinha o estabelecimento de um funcionamento desta humanidade. É ai que surge, com a Escolástica, a ética aristótelico-tomista como fundamento do bem comum. Além disso, outra passagem histórica importante foi o surgimento da Escola nominalista, precisamente com Guilherme de Ockham, segundo o qual o Ser é 'singular', e nada mais existe além do singular, assim como nos seus escritos políticos, onde só existem indivíduos. Outra discussão importante do Padre Ockham, tese reafirmada por ele próprio, refere-se ao direito de propriedade para os franciscanos, que tinham feito voto de pobreza. As teses filosóficas e teológicas de Ockham tiveram, outrossim, importância significativa na Escola de Salamanca, notavelmente na mudança radical do conceito de 'Ordem divina' para 'Vontade divina' no direito natural. (3)
No século XVI, pela influência dos dois principais representantes da Escola de Salamanca, Francisco de Vitória e Francisco Suárez, a teologia escolástica passa de uma noção de direito natural objetivo, fundamentado na natureza das coisas, a uma noção de direito subjetivo, fundamentados na razão individual. Enquanto afirma a unidade política do gênero humano, o jesuíta Francisco Suárez declara que o fato social e político não se explicitaria pela pura inclinação natural em uma direção sociabilidade: falta um ato de vontade dos homens e um acordo de suas vontades (a mesma ideia será retoma por Pufendord). Francisco de Vitória acrescenta que "o direito das gentes é o que a razão natural estabeleceu entre todos os povos". O direito se torna, então, sinônimos de uma faculdade individual conferida pela lei moral, com um poder moral para fazer. Com o direito subjetivo - assinala Michel Villey - o indivíduo se transforma "no centro e origem do universos" (De Benoist, Alain, p23). 
Essa virada metafísica na moralidade, no direito e na filosofia, viria a ser muito importante para os filósofos contractualistas, como Hobbes, Locke e Rousseau. Hobbes irá beber muito na fonte da razão natural de Francisco de Vitória, assim como Locke. A título de exemplificação, evocamos um excerto da obra Levitã feita por De Benoist, com o escopo de aclarar tal influência: "O direito natural é a liberdade que cada qual tem de utilizar seu próprio poder" (HOBBES, Thomas, capítulo 14). Isto é, o direito outrora objetivo demandado do cosmos extrinsecamente, declinou-se para o direito natural subjetivo moderno, onde tudo é deduzível do sujeito. O mesmo se verifica em Locke, segundo o qual o homem é um ser calculista. (4) 
Uma passagem importante que ilustra muito bem isso é extraída do livro Sources of the Self: The Making of Modern Identity do filosofo comunitarista Charles Taylor. 
Anteriormente se havia formulado este direito quando se dizia existir uma lei natural que proibia atentar contra uma vida inocente. Ambas as formulações parecem proibir as mesmas coisas. Porém, a diferença não reside tanto na proibição como no lugar que ocupa o sujeito. A lei é a quem devo obedecer. Pode me conferir certas vantagens e, em último, caso, a imunidade que assegura que minha vida, igualmente, deva ser respeitada. contudo, estou fundamentalmente submetido à lei. Em vez, um direito subjetivo é aquele cujo o titular pode e deve exercê-lo para atualizar. (5)
Todo desenvolvimento na criação do indivíduo perpassa e subjaz a metafísica da subjetividade e seu aparecimento sistemático e problemático. Primeiro com Descartes, o Cogito ergo sum 'Penso logo existo' como verdade indubitável, dá efeito na separação sujeito-objeto, assim como o poder avassalador da Reforma Protestante, com Lutero e Calvino e sua importância na separação de natureza e cultura na religião cristã. Além disso, Kant foi, também, muito importante para a veracidade do 'Eu': "O eu penso tem de poder acompanhar todas as minhas representações; pois do contrário, seria em mim algo que não poderia de modo algum ser pensado, o que equivale a dizer que a representação seria impossível ou, pelo menos para mim, não seria nada". (6)  
Por outro lado, a contribuição de Kant para a filosofia política moderna não cessa nas obras críticas, mas em seus pensamentos anteriores. As grandes perguntas que deram a ideia para suas obras críticas: 'O que posso conhecer?' (Crítica da Razão Pura), 'O que devo fazer?' (Crítica da Razão Prática) e 'O que eu devo esperar?' (Crítica da Faculdade de Julgar) termina com uma pergunta muito importante, que o pensador pós-estruturalista Michel Foucault, e outros, vão investigar filosoficamente acerca do nascimento das Ciências Humanas, que é 'O que é o homem?'. Nessa questão, Kant atribui status epistêmico ao homem. Esse homem, como objeto do conhecimento, vai, sem sombra de dúvidas, ser o ponto alto da consideração do século das Luzes e da Revolução Francesa; em atribuir ficções constitucionais de direitos inatos ao homem, em sua Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. 
2. Direito e Moral.  
Em um elogio à cultura indo-europeia, Alain de Benoist escreve aquilo que o Ocidente trouxe de melhor para o mundo: a objetividade. A saída da objetividade se deu, também,  no processo da metafísica da subjetividade. Tudo aquilo que outrora era objetivo, no bem comum, ou mesmo na distribuição do direito objetivo, sem o enquadramento moralista que ganhou na modernidade, foi abandonado no desenvolvimento e fundamentação da abstração do direito individual. "A declaração de direitos (humanos) não são declarações de amor, são, melhor, declaração de guerra". (7) 
Ademais, o universalismo dos direitos humanos é uma máquina de guerra em sua imposição de doutrina contra todas as tradições no mundo, assim, questionar esses direitos equivale a questionar a existência de Deus na era medieval. Segundo Alain de Benoist, os direitos humanos são um dogma religioso, assim como qualquer outro. Uma doutrina que instrumentaliza a tolerância para praticar intolerância demasiada bélica e universalista.
A ideologia dos direitos definiu classicamente "direitos humanos" como direitos inatos, inerentes à natureza humana, dos quais todo homem é portador desde o estado 'estado de natureza', a saber, antes de qualquer relação social (De Benoist, Alain, p. 17). 
Por conseguinte, a doutrina dos direitos humanos se fundamenta em um inatismo abstrato, isto é, o homem detém direito desde o nascimento, direitos subjetivos que veem junto com ele. Há uma diferença demasiada entre essa concepção de direito subjetivo com o direito objetivo de herança greco-romana, ou como De Benoist denomina: "direito natural clássico". O direito natural clássico, a saber, servia para manter uma equidade entre as partes em relação ao bem comum nas comunidades; a justiça no mundo antigo era de menos direito possível. (8)
Ademais, essa passagem importante que distingue o direito natural clássico do direito subjetivo, lembra muito a obra Considerações sobre a França de Joseph de Maistre, onde, há uma crítica feroz à Revolução Francesa (1789-1799) e uma inauguração da tradição contrarrevolucionária europeia em reação às trágicas mudanças morais e políticas da modernidade. Maistre, nessa obra, faz um diagnóstico profético acerca das nulidades das constituições modernas depois da revolução na França, análise esta que se concretizou como profecia nos séculos subsequentes: 
A constituição de 1795, como suas predecessor as, foi feita para o homem. Mas não existe no mundo nada que se posso chamar de homem. Ao longo de minha vida, tenho visto franceses, italianos, russos, etc.; sei também, graças a Montesquieu, que se pode ser persa. Mas, quanto ao homem, afirmo, que em toda minha vida, jamais o encontrei; se ele existe, desconheço-o completamente. 

Existe um único lugar do mundo onde não se possa encontrar um Conselho dos Quinhentos, um Conselho dos Anciões e cinco Diretores? Pode-se propor essa constituição a todas as associações humanas, da China até Genebra. Mas uma Constituição que é feita para todas as nações, não é feita para nenhuma: é uma pura abstração, uma obra escolástica feita para exercitar o espírito, partindo de uma hipótese ideal, e que está destinada ao homem, nos espaços imaginário em que habita. 

O que é uma constituição? Não é a solução dos seguintes problema? 

Dados a população, os costumes, a religião, a situação geográfica, as relações políticas, as riquezas, os bons e maus costumes atribuídos de uma determinada nação, encontra leis que lhe convenham. 

Porém, esse problema nem sequer foi abordado na Constituição de 1795, que só conseguiu pensar no homem. 

Portanto, todas as razões imagináveis concertam-se para estabelecer que o cunho divinos está ausente nessa obra. Trata-se somente de um tema. 

Em virtude disso, já nesse momento, quantos sinais de caducidade!  (9)
Com efeito, nesta passagem escrita por Maistre, fica claro que esse fracasso não se limita à Revolução Francesa, mas se expande no desenrolar da modernidade e na busca ininterrupta pela justificação da moral, como bem lembrado pelo filosofo aristotélico Alasdair MacIntyre em seu livro polêmico After Virtue. Nesta obra, o pensador escocês defende a tese de que a moralidade não existe, a não ser de maneira fragmentária ou simulada como premissas para conclusões absurdas e abstratas na afirmação duma moral racional. Outro aspecto interessante da obra é o diagnóstico do debate infinito e inconclusivo acerca de diversas morais racionais, a saber: é falho pensar em um consenso no debate ético-moral contemporâneo entre premissas e conclusões distintas: "[...] as premissas adversárias são tais que não temos meios racionais de solapar as afirmações uma com a outra..."(MACINTYRE, Alasdair, p. 24).
Não obstante, o caráter anti-histórico das éticas contemporâneas e a falta da impessoalidade se torna cada vez mais visível no processo gradual do fracasso.  Segundo MacIntyre, uma teoria moral importante na contemporaneidade é o emotivismo. Assim, essa teoria moral parte da premissa de que toda frase ética pressupõe uma prática. Por exemplo, a premissa "Isto é bom!" já pressupõe um imperativo: "Eu aprovo; aprove também", segundo um dos mais notáveis autores da metaética emotivista, C. L. Stevenson. Em contraste com Stevenson, MacIntyre afirma que o emotivismo errou em querer ser uma teoria dos significados, criando um circulo vazio. (10) 
Ademais, para MacIntyre, no começo do século XX o filosofo analítico G. E. Moore pensou algo semelhante ao emotivismo em sua obra prima Principia Ethica; o 'bem' passou a ser uma propriedade, assim como o 'amarelo', isto é, um status antinatural. Em seguida, dizer que um ato é certo, é o mesmo que dizer que dos atos alternativos e disponíveis se produz o maior bem. Portanto, a teoria ética de Moore já antecedeu o emotivismo, até mesmo porque a contemporaneidade, em todo o seu fracasso, abraçou, de modo subjacente, o emotivismo, que pode, talvez, ser análogo à metafísica da subjetividade. Em suma, o 'Eu' emotivista é semelhante ao 'Eu' sartriano; isto é, o 'Eu' não substancial, mas como campo de possibilidades, o nada. (11)    
Antes de tudo, o projeto iluminista de justificação da moral deu um passo largo para o declínio até alcançar o emotivismo. Em virtude disso, MacIntyre explora o desenvolvimento dessa justificação da moral pelos autores do século XVII e XVIII. No norte da Europa esse processo foi mais avassalador do que na própria França das Luzes. Um autor muito importante e analisado pelo pensador escocês é o teólogo Søren Kierkegaard, principalmente em sua obra Ou-Ou de herança kantiana, que se opõe frontalmente ao hegelianismo. Assim, na obra de Kierkegaard há uma característica de decisão na escolha entre dois caminhos: o ético ou o estético. Para MacIntyre, o caminho ético é o compromisso eterno, enquanto o estético está comprometido com ações imediatas de prazer (semelhante à ética utilitarista, se é que nos permitem). Contudo, o ético está além da razão, em subsunção exclusiva a princípios que podem ser impessoais. Entretanto, o caráter ambíguo do pensamento de Kierkegaard prejudica a fundamentação dessa afirmação ético-moral. (12)
Além disso, para MacIntyre, Kierkegaard é herdeiro do fracasso kantiano de afirmar a moral racional eliminando os princípios de felicidade e de impessoalidade religiosa; mas Kant, na Crítica da Razão Prática, faz uma autocrítica por ter excluído o aspecto teleológico de sua ética. Ademais, assim como Kierkegaard é herdeiro do fracasso kantiano, Kant é herdeiro do fracasso de Hume, Adam Smith e Diderot em suas buscas pela justificação da moralidade. Hume e Diderot perfilham este entendimento a partir das paixões, Kant pela razão e Kierkegaard, não descartando também as paixões da alma, procura ultrapassar a razão kantiana. Destarte, segundo MacIntyre, a ética aristotélica pensa na transição entre "o homem que ele é" para "o homem como poderia ser se realizasse sua natureza essencial", coisa muito diferente das propostas dos pensadores modernos, e isso está estreitamente conectado com o desenvolvimento das ciências da natureza e da revolução cientifica, no debate sobre a natureza do homem. A título de ilustração, o nascimento do indivíduo tem uma importância crucial para o deslocamento do homem em relação às funções que predominavam na ética aristótelico-tomista até o medievo. (13) 
Teve origem nas formas de vida social às quais dão expressão os teóricos da tradição clássica. Segundo essa tradição, ser homem é desempenhar um conjunto de papéis cada um dos quais tem seu propósito: membro de uma família, cidadão, soldado, servo de Deus. É somente quando se vê o homem como indivíduo, antes e fora de todos os papéis, que o "homem" deixa de ser conceito funcional. (14)
Ademais, uma passagem em que MacIntyre explica bem o desenvolvimento do fracasso dessas afirmações que fundamentaram de maneira perfunctória os "direitos do homem", hodiernamente cognominados "Direitos Humanos". 
Assim, não se trata apenas de não se poder justificar as conclusões morais do modo como antes se fazia, porém a perda da possibilidade na justificativa indica que uma mudança correlativa no significado do jargão moral. Portanto, o princípio da conclusão "sem 'deve'" de premissas "é" torna-se verdade irrefutável para filósofos cuja cultura só possua o vocabulário moral empobrecido que resulta dos episódios que acabo de contar. Aceitar isso como verdade lógica eterna foi sinal de uma profunda falta de consciência histórica que naquele tempo contaminou e ainda hoje contamina demais a filosofia moral, pois sua proclamação inicial, foi, em si, um evento histórico fundamental. Assinala tanto o rompimento final com a tradição clássica e o colapso decisivo do projeto do século XVIII de justificar a moralidade no contexto dos fragmentos herdados, porem, já incoerentes, deixados pela tradição. (15) 
Decerto que, no começo de sua obra, MacIntyre afirmou a existência de fragmentos ou simulacros de moralidade, que autores modernos viriam a herdar e usar como premissas para justificar conclusões éticas com um disfarce de 'neutralização'. Outrossim, é a veracidade da máxima do pensador escocês em que não há homem fora de uma tradição; tradição como um argumento estendido no tempo em constante diálogo interno e externo. (16)
Por outro lado, diferente da explicação de De Benoist sobre o direito, MacIntyre ilustra bem essa simultaneidade do indivíduo, em cuja compreensão subjaz, também, o 'direito' inato no individuo e a doutrina inquestionável desse moralismo. 
É claro que seria um tanto estranho que existissem direitos atribuídos aos seres humanos simplesmente qua seres humanos à luz do fato, que mencionei na minha exposição do argumentos de Gewirth, de que não há expressão em nenhuma linguagem antiga ou medieval que se traduza corretamente pela expressão "direito" até fins da Idade Média: o conceito carece de meios de expressão em hebraico, grego, latim ou árabe, clássico ou medieval. antes de cerca de 1.400, inexistente também no inglês antigo, ou mesmo no japonês até fins de meados do século XIX. Naturalmente, disso não se infere que não existiam direitos naturais nem humanos; segue-se apenas que ninguém podia saber que existiam. E isso suscita pelo menos certas questões. Mas não podemos nos preocupar em responde-las, pois a verdade e simples: tais direitos não existem e acreditar neles é o mesmo que acreditar em bruxas e unicórnios.  (17)
Ademais, o conceito de "direito" é uma ficção, e mais bizarro ainda soa a atribuição de direitos inatos ao homem, como já mostrou De Benoist. Carl Schmitt estava certo quando diagnosticou, e previu, indiretamente, a 'era das neutralizações' totais, o desmembramento de um fracasso moral em um projeto que já nasceu morto. Na simultaneidade do direito, além do homem detentor de direitos inatos, os tentáculos da neutralização e do enquadramento já atribuem direitos desde nascença aos animais domésticos. Nem mesmo os animais escapam à beligerância do politicamente correto e de sua incessante tirania em afirmar a existência de bruxas e unicórnios.
UMA LEITURA CRÍTICO-REFLEXIVA ACERCA DOS LUMINARES DA DEMOCRACIA OCIDENTAL
O intérprete da realidade sócio-política circundante não pode e nem deve abrir mão de lançar um olhar panorâmico à dinamicidade de funcionamento das estruturas de poder que, no mundo globalizado, irradia de macro-sistemas supra-estatais (oligarquias intergovenamentais e blocos de integração) e descem até alcançar os micro-sistemas localizados (Estados-Nação, em terminologia neo-hegeliana). O que choca neste cenário de interconversão do poder soberano em focos estratégicos de dominação a serviço de um esquema imperialista não é nem o fato de sermos governados pelos interesses de hiperpotências transnacionais que já consolidaram sua hegemonia v.g. na Assembleia Geral da ONU, mas o fato de essas potências quererem impor um padrão homogêneo de governabilidade aos países que escapam à sua zona de influência imediata. Uma pesquisa rápida nos revelará de maneira inequívoca o quão pateticamente seduzida e estupidificada está a civilização ocidental pelo “paradigma” do Estado Democrático de Direito, consagrado academicamente pelo frankfurtiano Jürgen Habermas.  
Desde o pós-segunda-guerra, os que tratam a democracia liberal como panaceia oferecem-na como única solução viável para a estabilização do dissenso dentro de um quadro de opções mais ou menos distinguíveis cuja única função é confundir o observador através da técnica da prestidigitação, forçando-o a contemplar no regime democrático, não a utopia irrealizável do reino prometeico da liberdade e da igualdade que sempre foi, mas um programa concretamente articulado  que retira seu fundamento de legitimidade da soberania popular, ou, como insiste Habermas, da “teoria do discurso”, que: 
Conta com a intersubjetividade mais avançada presente em processos de entendimento mútuo que se cumprem, por um lado, na forma institucionalizada de aconselhamentos em corporações parlamentares, bem como, por outro lado, na rede de comunicação formada pela opinião pública de cunho político. (HABERMAS, A Inclusão do Outro – estudos de teoria política, p. 280).
Contudo, a teoria habermasiana não passa de uma tentativa malsucedida de dissolver as concepções liberal e republicana clássica em um procedimento político-deliberativo vocacionado para a oportunização daquilo que o autor denomina “situação ideal de fala”. Habermas acredita piamente na tese de que a via normal para que cidadãos detentores do status de membros de uma comunidade política alcancem o consenso é a fluidez do dissenso nos circuitos institucionais democráticos, sem explicar de maneira satisfatória como isso pode ser efetivamente assegurado. Patenteia-se, assim, a influência dos precursores do giro linguístico-hermenêutico (Lwduing Wittgenstein e John Austin) na elaboração da teoria discursiva do direito. 
Sobre as democracias serem atualmente oferecidas como única solução viável para as questões internas e externas dos Estados soberanos frente ao espectro terrificante do “fundamentalismo”, o filósofo esloveno Slavoj Žižek, um dos mais fervorosos críticos de Habermas, assevera que:
A lógica oculta é evidentemente a mesma que está por trás da escolha imposta: você tem a liberdade de escolher o que quiser, desde que faça a escolha certa (...) O que é problemático na forma como a ideologia dominante nos impõe esta escolha não é o fundamentalismo, mas a própria democracia: como se a única alternativa ao “fundamentalismo” fosse o sistema político da democracia parlamentar liberal. (ŽIŽEK, Bem-Vindo ao Deserto do Real, pgs. 19 e 20) 
A opção pelo regime democrático deixa de ser produto espontâneo do exercício de uma faculdade por parte de nações soberanamente constituídas e se torna a imposição de um receituário apriorístico a partir do instante em que cai nas malhas pragmático-retóricas do discurso público, que tende invariavelmente a distorcer a realidade dos fatos em nome da ideologia dominante. Falar em democracia quando não se admite a veiculação do discurso anti-democrático e comina sanções penais a quem ousa proferi-lo é incorrer naquela espécie de contradição que ameaça a própria coerência interna do sistema defendido. Nesta senda, é o edifício democrático seu próprio algoz, na medida em que não reconhece como legítima a soberania de um povo que julga o programa democrático inadequado à persecução de seus objetivos.  
Ora, se a legitimidade do Estado Democrático de Direito dimana da livre associação e articulação discursiva como perfilha Habermas, por que o discurso totalitário, uma vez articulado, haveria de ser perseguido coercitivamente no bojo de uma sociedade pretensamente democrática? Nesse sentido, Julius Evola assevera que 
Por paradoxal que pareça, a “democrática “liberdade de opinião” devia comportar a legitimidade de professar e defender ideias anti-democráticas. Como não é assim, o resultado é um regime asfixiante e tirânico (de resto, são inúmeros os autores a afirmar que há poucos regimes tão intolerantes como os que apregoam a “liberdade”). (EVOLA, Il Fascismo: Saggio di una Analisi Critica dal Punto di Vista Della Destra, p. 92)
Poderíamos cavar ainda mais fundo aguilhoando que a repulsa ao discurso anti-democrático não se origina unicamente dos aparelhos repressivos de controle social numa ebulição althusseriana de perpétua auto-justificação demagógica, mas também da própria sociedade civil mergulhada em um transe hipnótico infundido pela incessante contrafação de inimigos a serem publicamente execrados, toda vez que alguém se atreve a gozar de sua “liberdade” e “igualdade de fala” para se manifestar ou exibir símbolos, signos ou sinais que a patrulha democrata julga impróprios ao contexto de “uma sociedade livre e igualitária”. O maior de todos os vícios do regime democrático é, de longe, o de arrogar para si o monopólio da definição de conceitos indeterminados, como “liberdade” e “igualdade”, atividade que, no fim das contas, traduz-se em abjeta genuflexão hipostática.   
Lastreado em G.K. Chesterton, Slavoj Žižek obtempera que o conforto em assumir uma posição democrática em relação ao “pensamento fundamentalista” se deve ao inconveniente de este último estribar-se em premissas dogmáticas, ao passo que aquela:
Despreza ironicamente todo engajamento integral, toda tomada de partido “dogmática”. Assim, estamos pregando a velha lição de como o significado ideológico de um elemento não está no próprio elemento, mas na forma como ele é “apropriado”, como é articulado numa cadeia? É verdade – com uma condição fatal: a de que devemos reunir a coragem de abandonar a “democracia” como o Significante-Mestre dessa corrente. A democracia é hoje o principal fetiche político, a rejeição dos antagonismos sociais básicos: na situação eleitoral, a hierarquia social é momentaneamente suspensa, o corpo social é reduzido a uma multidão pura passível de ser contada, e aqui também o antagonismo é suspenso. (ŽIŽEK, Bem-Vindo ao Deserto do Real, pgs.101 e 102) 
Nesse diapasão, a “soberania popular” (em nível infra-estrutural) e os “direitos humanos” (em instância superestrutural) não passam de uma blindagem à máquina de guerra do estabilishment progressista. A inclinação ocidental por esse tipo de regime deflui dos comandos de reoxigenação que ele parece emitir no que tange à eliminação seletiva de células dissidentes com vistas a um ideal de higienização supremacista e altamente profilático. Em suma: as democracias ocidentais absorveram tudo o que de mais teratologicamente insano concorre para a caracterização dos organismos políticos totalitários. Então, não se trata evidentemente de discriminar ambos os modelos a partir de qualificativos binários, como “melhor e pior”, “bom e mal” (como se os defeitos de um eximissem o outro de prestar contas pelas suas próprias imperfeições), mas tão somente de entender as democracias liberais com a re-substancialização do totalitarismo em uma nova perspectiva aparentemente mais tolerável e “aberta para o futuro”, o que acaba por torná-la infinitamente mais perigosa do que qualquer ideologia assumidamente totalitária.
A sentença do romancista britânico Aldous Huxley sintetiza magnificamente o teor das considerações até aqui expendidas: “a ditadura perfeita terá as aparências da democracia, uma prisão sem muros na qual os prisioneiros não sonharão com a fuga. Um sistema de escravatura onde, graças ao consumo e ao divertimento, os escravos terão amor à sua escravidão”. Não sem certa razão, Aristóteles via na democracia (assim como na oligarquia e na tirania) um desvio das formas de governo tradicionais (monarquia, aristocracia e governo constitucional). O filósofo estagirita percebeu há mais de dois mil anos (no século III a.C.) o que o ocidente pós-moderno se recusa a aceitar: que o regime democrático constitui, par excellence, um vício, e não uma virtude excelsa.  
O patógeno já começa a infectar o organismo biopolítico desde o momento em que fornece o estatuto paradigmático àquilo que, em verdade, não passa de uma ferramenta de desestabilização de unidades políticas mais fragilizadas a serviço da intrusão neocolonialista. Um belo exemplo de “democracia” é o que acontece quando os EUA se auto-legitimam pelo patriot act a bombardearem o Aferganistão sob o (falso) pretexto de se protegerem de ataques terroristas em potencial (abstratos). Jürgen Habermas ignora visivelmente o fato de que, assim como a descoberta do átomo, as democracias ocidentais podem (e são!) utilizadas como armas de destruição em massa, independente da maneira pela qual se dá sua operacionalidade e a despeito de quão nobres possam ser julgadas suas intenções. O fato de essa destruição ocorrer fora do alcance contingente dos meios de comunicação de massa em nada atenua sua gravidade. A contrario sensu, intensifica-a, uma vez que confere a um cenário extremamente problemático a aparência da mais idílica e desejável normalidade. 
Outro defeito condenável dos democratas é o de pretenderem-se melhores e mais justos do que os defensores de regimes cujos porta-vozes não se limitam a reproduzir ambiguidades semânticas (v.g. “isegoria” e “isonomia”), como se o emprego isolado de tais vocábulos significasse alguma coisa fora de seu contexto originário. Curiosamente, o democrata Robert A. Dahl aponta exatamente esse déficit cognitivo no escalonamento hierárquico da guardiania platônica, ideia segundo a qual o governo deve pertencer a um rei-filósofo oriundo da casta dos guardiões. Nas palavras de Dahl:
Boa parte da persuasão da ideia de guardiania vem da sua visão negativa da competência moral e intelectual das pessoas comuns. Mas ainda que essa visão fosse aceita (...), isso não significa que existem guardiões em potencial com conhecimento e virtude definitivamente superiores ou que eles possam ser criados, tampouco que se possa confiar neles para governar em prol do bem público. (DAHL, A Democracia e seus Críticos, p. 100) 
E por que deveríamos confiar nos anseios dispersivos de uma massa fragmentária de indivíduos cuja única semelhança é o fato de partilharem um mesmo espaço de deliberação no processo de tomada de decisões coletivas? O que o professor emérito de ciência política da Universidade de Yale parece ignorar é que a complexidade das discussões que têm sido encetadas em nível global transcende os domínios da política comparada para abranger outras áreas do conhecimento, como, por exemplo, a geopolítica, a sócio-antropologia, as relações internacionais e a etno-sociologia. Pretender diagnosticar questões complexas a partir de falácias lógicas do tipo modus ponens é, no mínimo, desonestidade intelectual, quando não uma necessidade patológica de viver em deliberada auto-ilusão.
Com efeito, os membros de uma comunidade política regida hipoteticamente por uma elite guardiã carecem, individualmente, das condições necessárias para garantir que o rei-filósofo governa com base no estrito cumprimento do Sumo-Bem, porquanto este, segundo Platão, é insuscetível de ser divisado mesmo através de operações cognoscitivas. Todavia, a pergunta a ser feita não é se os governados são dotados de atributos que lhes permitem demonstrar objetivamente a legitimidade soberana dos governantes, mas se possuem a faculdade de reconhecer como legítima a autoridade do titular do poder soberano. Existe um abismo intransponível entre a demonstração (limitada pela neutralidade do ponto de vista do observador externo) e o reconhecimento (que independe de quaisquer critérios de neutralidade objetiva) que nenhuma espécie de “livre associação comunicativa” é capaz de colmatar.
Um dos maiores prejuízos suscitados pela virada linguística para o pensamento ocidental tem a ver com o rechancelamento da pretensão materialista típica da epistemologia cartesiana. Destarte, tanto Habermas quanto Dahl excluem proposições metafísicas do iter procedimental que constrói a plataforma deliberativa, encapsulando hermeticamente a estruturação democrático-discursiva dentro de si mesma. Habermas, que se vangloria por ter superado as premissas da teoria dos sistemas sociais do jus-sociólogo Niklas Luhmann, em verdade, não fez mais do que acatá-la sob pressupostos diversos dos originalmente elencados, na medida em que, condicionando o desdobramento comunicacional do discurso público à autopoiese do racionalismo cientificista, acabou imunizando o regime democrático a considerações de natureza supra-empírica. O discurso teológico, mítico, tradicionalista, gnosiológico e metafísico não seria pacificamente recepcionado pelas instituições democráticas, mas, antes disso, estigmatizado e impugnado de plano como a inexorável encarnação do retrocesso totalitário.  
Slavoj Žižek fulmina impiedosamente as bases da concepção democrática, prelecionando que:
Na Velha República Alemã era impossível uma pessoa combinar três características: convicção (fé na ideologia oficial), inteligência e honestidade. Quem acreditava e era inteligente, não era honesto; quem era inteligente e honesto, não acreditava; quem acreditava e era honesto, não podia ser inteligente. O mesmo não se aplica à ideologia da democracia liberal? Quem finge levar a sério a ideologia liberal hegemônica não pode ser ao mesmo tempo inteligente e honesto: ou é estúpido ou um cínico corrompido. (ŽIŽEK, Bem-Vindo ao Deserto do Real, pgs. 93 e 94)  
E acrescenta mais adiante, com notória jocosidade: 
Portanto, se me permite uma alusão de mau gosto ao Homo sacer de Agamben, quero afirmar que o modo liberal dominante de subjetividade hoje é o Homo otarius: ao tentar manipular e explorar os outros, acaba sendo ele o verdadeiro explorado. Quando imaginamos estar zombando da ideologia dominante, estamos apenas aumentando seu controle sobre nós. (ŽIŽEK, Bem-Vindo ao Deserto do Real, p. 94)  
O grande paradoxo das democracias liberais hodiernas consiste no fato de que, quanto maior o grau de “liberdade” e ”igualdade” abstratamente outorgado aos cidadãos no procedimento de tomada de decisões coletivas, menos “livres” e “iguais” eles se tornam efetivamente, posto acreditarem ter esgotado todas as possibilidades de escolha, além das quais não há absolutamente nada a ser desejado e perseguido como projeto de vida boa. O regime democrático pode ser explicado através da metáfora zizekiana do café descafeinado, que descreve a perpétua inquietação suscitada pela pseudo-realização de um programa irrealizável. 
De todo o acima exposto, evocamos as sábias palavras do professor Alexandr Dugin sobre o fracasso das democracias ocidentais e sobre porque elas devem ser combatidas: 
É-nos dito (através da hipnose e propaganda) que “não pode ser” de outra forma (do que é agora). Ou que qualquer alternativa seria “ainda pior”. Essa melodia familiar diz que “a democracia tem muitos defeitos, mas todos os outros regimes políticos são muito piores, é melhor tolerar o que já está”. Isso é mentira e propaganda política. O mundo em que vivemos, é inaceitável, intolerável, levando-nos à morte inevitável e encontrar uma alternativa para isso é uma condição de sobrevivência. Se não derrubarmos o status quo, não mudarmos o curso do desenvolvimento da civilização, não privarmos do poder, não destruirmos a oligarquia mundial como um sistema e como forças específicas, grupos, instituições, corporações e até mesmo indivíduos, nós vamos nos tornar não apenas vítimas, mas também cúmplices do fim iminente. As “alegações de que “tudo não é tão ruim”, “antes era pior”, “de alguma forma tudo vai ficar melhor”, etc, é uma forma deliberada de sugestão, hipnose, destinada a acalmar os resquícios de consciência livre, independente de análises sóbrias. (DUGIN, Geopolítica do Mundo Multipolar, p. 181)  
CRÍTICA AO REGIME DEMOCRÁTICO SOB A ÓTICA DO TRADICIONALISMO STRICTO SENSU DE JULIUS EVOLA, RENÉ GUÉNON E SAVITRI DEVI
O que nos motivou a buscar respaldo na concepção tradicionalista com o escopo precípuo de desmistificar o regime liberal-democrata foi a esperança de que, ao reinserir pensamentos desta natureza na procedimentalidade do discurso público, possamos quebrar o engessamento da teoria democrática através de seus próprios mecanismos institucionais. Para tanto, é imperioso destacar, desde logo, que tal mister só poderá ser alcançado mediante uma ruptura radical com a comunicabilidade seletiva, que torna a veiculação do discurso de um certo grupo de interesses cinicamente mais “justa e igualitária” do que de outros. A intenção, desde o início, tem sido explicitar a maneira pela qual um sistema de “co-legisladores” que se auto-legitima a si mesmo desperta os ideais mais perversos e ignominiosos em detrimento dos variados tipos de arcabouços civilizacionais e costumes tradicionalmente arraigados, ao ponto de tornar admissível o sacrifício da soberania política de povos inteiros em prol do sonho democrático de um ocidente que carece dos instrumentos hábeis a garantir sua própria sobrevivência na arena geopolítica mundial.     
Em sua célebre Revolta Contra o Mundo Moderno, o barão italiano Julius Evola procede a uma investigação meticulosa acerca da decadência da civilização ocidental, perscrutando as causas que a deflagraram no interior dos mais diversificados ciclos cósmicos. Para os fins do presente estudo, nos limitaremos a realizar uma explanação evoliana acerca do ciclo helênico, no bojo do qual se encontra catalogada a ontogênese do sistema democrático. 
Segundo Evola, o cisma que abalou a configuração aristocrático-sacral das primeiras cidades gregas deu ensejo à progressiva institucionalização de um regime centrado na secularização dos anseios populares. 

Um fermento revolucionário altera a partir das bases as antigas instituições, a antiga concepção do Estado, da lei, do direito e da própria propriedade – e dissociando o poder temporal da autoridade espiritual, reconhecendo o princípio electivo e introduzindo instituições que foram se abrindo progressivamente às camadas sociais inferiores e à impura aristocracia do censo (casta dos mercadores: Atenas, Cumes, etc.), e, finalmente, à própria plebe protegida pelos tiranos populares (Argos, Corinto, Sicyone, etc.) – dá lugar ao regime democrático [no qual] realeza, oligarquia, burguesia e, para terminar, dominadores ilegítimos (...) vão buscar o seu poder [em] um prestígio puramente pessoal e que se apoiam no demos, são estas as fases da involução que, depois de se ter manifestado na Grécia, se repete na Roma antiga e se realiza em seguida em grande escala e de uma maneira total no conjunto da civilização moderna. (EVOLA, Revolta Contra o Mundo Moderno, p. 344)   
Entretanto, os inconvenientes do princípio democrático não devem ser interpretados como produzindo uma repercussão meramente política, a teor do que inescrupulosamente vêm sustentando os críticos mais contumazes da democracia burguesa ocidental, isso porque o “fenómeno político está estreitamente ligado a manifestações análogas que atingem mais directamente o plano do espírito”. (EVOLA, Revolta Contra o Mundo Moderno, p. 344)
A redefinição estrutural das instituições que regem funcionalisticamente as relações de poder no seio de um microssistema sócio-político regionalizado (ou no contexto do intercâmbio entre várias comunidades políticas) produz consequências desagregadoras na espiritualidade professada dentro do referido microssistema. Daí o erro grosseiro decorrente da interpretação atomizada do fenômeno político no qual incorre as ciências analíticas ao pretenderem isolar seu objeto de estudo com o afã de apreendê-lo mediante a técnica do desmembramento, herdada das ciências naturais.  
Portanto, para entendermos a dimensão real dos males democráticos, bem como suas principais contribuições para o colapso iminente da civilização ocidental, urge mergulharmos em uma abordagem essencialmente transdisciplinar que, por um lado, não ignore a fenomenologia política em sua totalidade, mas que, por outro, não se atenha única e exclusivamente a ela, trazendo a lume questões de índole escatológica. Somente a partir do instante em que passamos a assumir a existência de uma interpenetração cósmico-simbólica do sistema político com os sistemas esotéricos de base metafísica é que poderemos atacar o âmago da questão livres de pré-conceitos e precipitações reducionistas.   
Nesta ordem de ideias, Julius Evola reputa à democracia helênica o esgotamento da figura arquetípica do herói grego e da desnaturação do conceito hermético (pré-helênico) de imortalidade da alma. 
É assim que nasce e se difunde na Grécia a estranha ideia de que a imortalidade é uma coisa quase normal para qualquer alma de mortal; paralelamente, democratiza-se a noção de herói a ponto de em certas regiões – por exemplo na Beócia – se acabar por considerar como <<heróis>> homens que – como exprimiu argutamente alguém – de heroico não tinham senão o simples fato de estarem mortos. (EVOLA, Revolta Contra o Mundo Moderno, p. 344 e 345).
Essa descaracterização da espiritualidade típica de sociedades aristocráticas foi e continua sendo nos dias de hoje alimentada pela crença cega em valores seculares, como o humanismo, o cientificismo e o racionalismo, que muito antes do advento do século das luzes podiam ser vislumbrados, ainda que de maneira bastante tímida e residual, nas pólis gregas. 

Mais tarde os deuses, já enfraquecidos pela sua transformação em figuras mitológicas, tornaram-se conceitos filosóficos, ou seja, em abstracções, ou então em objetos de um culto esotérico. A emancipação do indivíduo, em relação à tradição, sob a forma de <<pensador>>, a afirmação da razão como instrumento de livre crítica e de conhecimento profano, derivaram normalmente desta situação. E é precisamente na Grécia que elas se manifestaram, pela primeira vez, de uma maneira característica. (EVOLA, Revolta contra o mundo Moderno, p. 344)   
Todavia, a despeito de sua origem helênica, as democracias modernas não guardam a mínima semelhança estrutural com o modus de organização política das cidades-Estado gregas, uma vez que, assimilado pelos ideais iluministas de matriz europeia, o fenômeno democrático passou a ser compreendido sob um enfoque estritamente quantitativo, voltado para o interesse majoritário, consoante apregoa René Guénon.
Isso leva-nos imediatamente a perceber em que é que está essencialmente errada a idéia segundo a qual a maioria deve fazer a lei (...) A opinião da maioria só pode ser a expressão da incompetência, quer esta resulte da falta de inteligência, ou da ignorância pura e simples. Pode-se fazer intervir, a este respeito, certas observações de “psicologia coletiva” e lembrar notadamente o fato bastante conhecido de que, numa multidão, o conjunto das reações mentais que se produzem entre os indivíduos que a compõem leva à formação de uma espécie de resultante que não está nem sequer no nível da média, mas no nível dos elementos mais inferiores. (GUÉNON, Crise do Mundo Moderno, p. 70) 
As objeções de Guénon às premissas estruturantes das democracias ocidentais registradas em Crise do Mundo Moderno devem ser compreendidas à luz do que o autor denomina “metafísica pura”, em relação à qual a selvageria política de uma cotidianidade viciada e reiteradamente fustigada por imperfeições teórico-práticas situa-se muito aquém do nível desejável de reflexão e ponderação, o que acaba repercutindo negativamente na capacidade do sistema de solucionar eventuais conflitos de interesse. Associando a metafísica pura ao motor-imóvel aristotélico, Guénon estabelece uma dissociação radical entre as ciências contemplativas (ou especulativas), voltadas para o logos espiritual inerente a cada sistema religioso e as ciências profanas, de caráter eminentemente positivista/materialista. 
A importância deste desdobramento conceitual reside no fato de que os regimes seculares embasados pelo iluminismo pré-moderno (inclusive – e, sobretudo - a democracia) são incapazes de solucionar de maneira necessária (não-acidental) as polêmicas que ele vive fomentando e retroalimentando monotonamente no desenrolar de um verdadeiro circunlóquio. Questões que já deviam ter sido superadas voltam a emergir no contexto de uma sociedade plúrima, que, exatamente por admitir um sem número de “respostas possíveis”, incorre no embaraço de não responder coisa alguma. Destarte, a ansiedade desencadeada pela busca de soluções abstratas para todos os problemas do mundo torna-se inversamente proporcional à efetiva concreção e aplicação desses prognósticos.   
Como um autoproclamado anti-polemista, Guénon faz gravitar suas elucubrações em torno de uma constelação hermenêutica diametralmente oposta ao cientificismo racionalista. Isso porque, na cosmovisão do autor, o tratamento das ciências profanas e suas ramificações como sistemas cognitivos autossuficientes só poderá resultar em uma “dispersão na multiplicidade”.
As ciências seculares devem ser compreendidas como meros prolongamentos da metafísica pura (fonte de sua unidade e legitimidade), reconhecendo a posição a elas reservada na hierarquia cósmica. Em síntese apertada, porém completa: a metafísica pura “unifica” as ciências vulgares em um agregado coerente, no sentido de fornecer a elas a coesão necessária à adequada otimização de seu potencial cognoscitivo. Portanto, a teoria democrática pode ser impugnada como:
A inversão completa da ordem normal, visto que é a proclamação da supremacia da multiplicidade como tal, supremacia que, de fato, só existe no mundo material. Pelo contrário, no mundo espiritual e mais simplesmente ainda na ordem universal, é a unidade que está no cimo da hierarquia, porque é ela o princípio de onde parte toda a multiplicidade; mas quando o princípio é negado ou perdido de vista, só resta a multiplicidade pura, que se identifica com a própria matéria. (GUÉNON, Crise do Mundo Moderno, p. 71) 
O que está implícito no excerto guénoniano é que o elevadíssimo grau de incerteza ofertado pelo regime democrático fá-lo padecer de uma ausência de configuração própria e contornos semânticos específicos, tornando impossível ao hermeneuta ordinário sondar os limites de sua operacionalização na topografia de uma realidade sócio-política extremamente limitada, o que nos forçaria não só a ampliar ad infinitum o rol de considerações crítico-reflexivas acerca de um mesmo objeto como também a buscar respaldo para a resolução de certos conflitos na cosmo-esfera de uma ordem transcendente, alógena ao espaço e ao tempo. É assim que as imperfeições inerentes ao universal pragmático habermasiano o aproximam mais de um auto-encapsulamento impermeabilizante da comunicabilidade cidadã do que de uma via alternativa de estabilização das expectativas de comportamento.  Destarte:
O argumento mais decisivo contra a “democracia” resume-se em poucas palavras: o superior não pode emanar do inferior, porque o “mais” não pode sair do “menos”; isto é de um rigor matemático absoluto, contra o qual nada poderia prevalecer (...) É demasiado evidente que o povo não pode conferir um poder que ele próprio não possui; o verdadeiro poder só pode vir do alto, e é por isso, diga-se de passagem, que só pode ser legitimado pela sanção de alguma coisa superior à ordem social, ou seja, uma autoridade espiritual. Se for de outra maneira, será apenas uma contrafação de poder, um estado de fato que injustificável por defeito de princípio, e em que não pode haver senão desordem e confusão. (GUÉNON, Crise do Mundo Moderno, p. 69)          
Pode-se, a título de esclarecimento, fazer uma homologia entre o papel desempenhado pelo titular do poder soberano em uma aristocracia régia com o funcionamento de um organismo biológico, que tem todos (ou quase todos) os órgãos condicionados pelo bombeamento de sangue oriundo dos movimentos de contração e dilatação (sístole e diástole) do músculo cardíaco. O mesmo ocorre em um grupamento sócio-político devidamente administrado pela figura de um líder central, cujas deliberações refletem a vontade dos governados, sem, contudo, se confundir com ela, como se verifica nas democracias ocidentais de orientação liberal. 
Ao líder hereditário, sístole e diástole de uma comunidade fisiologicamente unificada, deve ser conferida autoridade plena para tomar decisões em nome da coletividade, uma vez que, da mesma maneira que um organismo não escolhe sua saúde coronária, os governados não têm competência para escolher, mediante sufrágio universal, seu guardião. Não compete ao homem médio redefinir a plataforma axiológica do seu espaço de interação, porque se a comunidade da qual faz parte fosse passível de ser alterada idiossicraticamente, então o “fazer parte” sobejaria degenerado, na medida em que este pressupõe a assunção de condicionantes exógenas à vontade de pessoas e/ou grupos específicos. O “fazer parte” não pode ser desmembrado em várias partes do “fazer parte”. Do contrário, o próprio ideal de unificação se dissiparia feito poeira, arrastando consigo o sentido de coerência do holismo comunitário e da própria ordem política concebida como um todo organicamente articulado.  
Os chamados tradicionalistas em sentido estrito são unânimes em afirmar que o ocidente caminha para o seu sepultamento, na medida em que o logos ancestral vai sendo exponencialmente sobrepujado pelo frenesi espasmódico progressista manifesto pelos mais variados segmentos ideológicos da modernidade. A ideologia secular preencheu todos os espaços dantes ocupados pela moral espiritual, trazendo em seu bojo postulados que reinterpretam a si mesmos sob diversos ângulos e perspectivas; é como se todos os filósofos e politólogos desde René Descartes explorassem a mesma ideia de formas diferentes, fazendo com que os erros de outrora se tornem ainda mais acentuados. Por esta razão, os democratas pós-modernos enganam-se redondamente ao creem-se libertos do invólucro dogmático que pairava sobre seus predecessores na modernidade. Tal qual a maldição do Dr. Viktor Frankenstein na crônica de Mary Shelley, o caráter sectário típico das ideologias de massa impregna as democracias contemporâneas de maneira simbiótica. Criador e criatura lutam incansavelmente para se separarem, mas o fato de serem frutos de uma mesma experiência amarra suas vidas a um único e inevitável destino.    
É nesse sentido que Savitri Devi aduz que o homem moderno
É ensinado – nos países democráticos, de qualquer modo – que ele é livre em todos os aspectos; que ele é “um indivíduo, que responde a ninguém, mas somente à sua “consciência” e todo o seu ser, tão completamente de acordo com o padrão, que ele não é mais capaz de reagir de uma forma diferente. E como pode um homem assim falar de “pressão sobre o indivíduo” em qualquer sociedade, seja ela antiga ou moderna! (DEVI, O Relâmpago e o Sol, p. 7)   
Pode-se, ainda, tecer críticas arrasadoras à democracia neoliberal, identificando-a como um dos elementos que caracterizam a (assim denominada pela cosmologia hindu) Quarta Idade, Idade Sombria ou simplesmente Kali Yuga. Conforme o escólio de René Guénon:
A doutrina hindu ensina que a duração de um ciclo humano, ao qual dá o nome de Manvantara, divide-se em quatro idades, que correspondem a fases de um obscurecimento gradual da espiritualidade primordial; são esses mesmos períodos que as tradições da Antiguidade ocidental, por seu lado, designavam como as Idades de Ouro, de Prata, de Bronze e de Ferro. Estamos presentemente na quarta Idade, Kali-Yuga ou “Idade Sombria”, e estamos nela, afirma-se, há mais de seis mil anos, ou seja, desde uma época bastante anterior a todas aquelas que são conhecidas da História “clássica”. Desde então, as verdades que eram outrora acessíveis a todos os homens tornaram-se cada vez mais dissimuladas e difíceis de atingir; aqueles que as possuem são cada vez menos numerosos e, se o tesouro da sabedoria “não humana”, anterior a todas as idades, nunca se pode perder, ele se envolve no entanto em véus cada vez mais impenetráveis, que o escondem aos olhares e sob os quais é extremamente difícil descobri-lo. (GUÉNON, Crise do Mundo Moderno, p. 9)
Savitri Devi corrobora o teor destas elucubrações, acrescentando que a Kali Yuga é
a fase em que a mentira é chamada de “verdade” e a verdade é perseguida como falsidade ou ridicularizada como loucura; em que os expoentes da verdade, os líderes divinamente inspirados, os verdadeiros amigos de sua raça e de toda a vida – os homens como Deus – são derrotados, e seus seguidores humilhados e sua memória caluniada, enquanto os mestres das mentiras são tidos como “salvadores”; a fase em que cada homem e mulher está no lugar errado, e o mundo é dominado por indivíduos inferiores, raças bastardas e doutrinas viciosas, tudo parte integrante de uma ordem inerente de feiura muito pior do que a completa anarquia. (DEVI, O Relâmpago e o Sol, p. 13)   
As considerações de Julius Evola sobre a decadência da civilização ocidental a partir do ciclo helênico reforçam a ideia de que as democracias contemporâneas só poderiam triunfar em um território no qual o humanismo iluminista está profundamente enraizado como fator de ressemantização ontológica da estrutura da realidade, o que torna imperiosa a constatação de que a tradição não pode sobreviver num ambiente em que inexiste uma correspondência recíproca entre o sagrado e o profano, em que esta reciprocidade foi castrada pelo sentimentalismo humanista de tessitura laica ou secular.
O humanismo – tema característico da idade do ferro – já se anunciava através do aparecimento de um sentimentalismo religioso e da dissolução dos ideais de uma humanidade virilmente sagrada. Mas o humanismo abre resolutamente outras vias, em particular na Hélada, com o advento do pensamento filosófico e da investigação física. E a este respeito não se manifesta nenhuma reação tradicional considerável; pelo contrário, assiste-se ao seu desenvolvimento regular, paralelamente ao desenvolvimento de uma crítica laica e antitradicional; foi como que a propagação de um cancro nos elementos sãos e anti-seculares que ainda subsistiam na Grécia. Embora isto corra o risco de ser dificilmente concebível para o homem moderno, é verdade que historicamente a predominância do <<pensamento>> é um fenômeno marginal e recente – mesmo sendo anterior À concepção puramente física da natureza. O filósofo e o <<físico>> não passam de dois produtos degenerescentes surgidos numa fase já avançada da última idade, a idade do ferro.Esta <<descentralização>> que, no decorrer das fases já consideradas, veio a separar gradualmente o homem de suas origens, deveria finalmente fazer dele, em vez de um ser, uma existência, ou seja, <<algo que está de fora>>, uma espécie de fantasma, de tronco, que no entanto terá a ilusão de reconstruir sozinho a verdade, a sanidade e a vida.  (EVOLA, Revolta Contra o Mundo Moderno, p. 347)
É esta atmosfera impregnada de um racionalismo infra-humano na qual vicejam os mais desarrazoados impropérios que vêm sustentando a crença popular em um regime pretensamente superior à própria história, não em termos de uma transcendentalidade imanente, mas no sentido de uma completa intransigibilidade para com doutrinas não alinhadas aos corolários da marcha ocidental rumo ao colapso civilizacional. Não há nada de surpreendente no fato de o regime democrático procurar, desesperadamente, um sentido de autojustificação na historiografia contemporânea, porque este é precisamente o campo em que sua derrota se verifica de maneira mais escancarada. O que se tem não é uma justificação real, historicamente fundamentada, e sim uma aparência de legitimidade, ou uma legitimidade virtualmente imposta pela ruptura da história com a pré-história.
Evocamos o magnífico excerto de Giorgio Agamben para contrastar com o pano de fundo explorado neste tópico, e que resume de maneira grandiloquente a crise moral e espiritual das democracias hodiernas:
Daqui, sobretudo, a singular inquietude do poder exatamente no momento em que se encontra diante do corpo social mais dócil e frágil jamais constituído na história da humanidade. É por um paradoxo apenas aparente que o inócuo cidadão das democracias pós-industrial (o bloom, como eficazmente se sugeriu chama-lo), que executa pontualmente tudo o que lhe é dito e deixa que os seus gestos quotidianos, como sua saúde, os seus divertimentos, como suas ocupações, a sua alimentação e como seus desejos sejam comandados e controlados por dispositivos até nos mínimos detalhes, é considerado pelo poder – talvez exatamente por isso – como um terrorista virtual. Enquanto a nova normativa europeia impõe assim a todos os cidadãos aqueles dispositivos biométricos que desenvolvem e aperfeiçoam as tecnologias antropométricas (das impressões digitais à fotografia sinalética) que foram inventadas no século XIX para a identificação dos criminosos reincidentes, a vigilância por meio de videocâmera transforma os espaços públicos das cidades em áreas internas de uma imensa prisão. Aos olhos da autoridade – e, talvez, esta tenha razão – nada se assemelha melhor ao terrorista do que o homem comum. (AGAMBEN, O Que é o Contemporâneo, pgs. 49 e 50)  
O CARÁTER RIZOMÓRFICO DAS DEMOCRACIAS CAPITALISTAS SOB O PRISMA DA ESQUIZO-ANÁLIZE DELEUZO-GUATTARIANA
Neste tópico, analisaremos as democracias burguesas à luz da esquizo-análise de Gilles Deleuze e Felix Guattari, apontando as deficiências e contradições subjacentes à tese que preconiza a existência de um “sistema democrático”.  Quer-se, com isto, evidenciar que a expressão “sistema democrático” encerra um oximoro, na medida em que a molecularização dos focos de centralidade e operacionalidade decorrentes da essência mesma do regime democrático vai de encontro a quaisquer pretensões de sistematicidade, colocando em xeque o próprio caráter de reductio ad uno que Robert Dahl, Jürgen Habermas, Norberto Bobbio et caterva procuraram tão obstinadamente imprimir às democracias contemporâneas. Oportuno recordar o paradoxo democrático para uma melhor compreensão da abordagem em tela, qual seja: o de que a persecução de um ideal de abertura para o futuro transforma a democracia em um sistema fechado, mas somente enquanto “corpo sem órgão” nas latitudes movediças de um devir equacionado pela singularidade rizomórfica do Ecúmeno; isto é: sem levar em consideração a outra face da “dupla articulação”, o Planômeno.   
Embora na propaganda democrática a configuração de um regime pautado na veiculação de códigos binários (o sim/não habermasiano) como critério de tomada de decisões no curso do procedimento deliberativo conserve uma aparência de centralidade similar à morfologia estrutural sedentária típica da árvore-raiz, as democracias capitalistas advogam um raciocínio contraposto, a saber: o do livro-mundo nomadológico, na medida em que o discurso democrático erige-se em subproduto de rearranjos de micromultiplicidades produzidas e reproduzidas através de seus próprios mecanismos radiculares. Isso, por si só, já seria mais do que suficiente para desmistificar a ”coesão interna” entre Estado de Direito e democracia e a própria ideia de um “mundo da vida” rigorosamente encarado por Habermas como o espaço de discursividade público-privado. Pode-se afirmar, a partir da fórmula geral do esquizo fornecida por Deleuze e Guattari, que o funcionamento do Estado Democrático de Direito, sincronizado com o “agenciamento maquínico” do iluminismo, consubstancia as “linhas de lobo”, ou “linhas de desterritorizalização”, tornando o mundo da vida habermasiano um deserto povoado, que “se opõe menos aos órgãos do que a uma organização que compõe um organismo com eles. O corpo sem órgãos não é um organismo morto, mas um organismo vivo, e tão vivo e tão fervilhante que ele expulsou o organismo e sua organização”. (DELEUZE e GUATTARI, Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, vol. 1, pgs. 41 e 42)    
Ao contrário dos Estados orgânicos, escalonados hierarquicamente e legitimados a partir de uma moralidade transcendente, o sentido de autojustificabilidade dos Estados democráticos constitui, a um só tempo, produto e geratriz da sua operabilidade horizontal. 
No fim, todas as formas de simetria vertical (as orientações “de cima para baixo”, hierárquicas) estão sujeitas à destruição e se tornam horizontais. Similarmente, a linha vertical de poder e o Estado se tornam horizontais e assim a antropologia política, empregando essa ou aquela constituição do indivíduo, se dissipa e se dispersa no espaço da poeira rizomática. (DUGIN, A Quarta Teoria Política, p. 109)
É assim que as democracias capitalistas, tal qual o esquizo deleuziano, podem ser descritas como um pseudo-sistema supra-infra-dimensional, na medida em que justapõe seus fragmentos subjuntivos e transcendentes, equalizando-os na expansividade horizontalizada de múltiplos estratos que convergem para um núcleo–pivô auto-replicante. Nas democracias liberais, o homem “é um obstáculo no caminho de si mesmo, ele perturba e incomoda a si mesmo. Um homem cai diante de esquizomanias individuais como foi retratado por Deleuze em “Anti-Édipo” (DUGIN, A Quarta Teoria Política, p. 130) 
Destarte, o regime democrático é simplesmente insuscetível de ser assimilado a partir da arregimentação e concatenação de micrologismos no bojo de uma estrutura fractal criptografada, e o que os democratas vendem como “estrutura” (no sentido arborescente de massa molar), em verdade, não passa de uma pseudo-estrutura (no sentido rizomórfico de matilha molecular) ou imitação do real pelo sobredimensionamento de uma virtualidade esquizoide. É neste sentido que Slavoj Žižek atribui a Deleuze o epíteto de filósofo do virtual:
La primera determinación que se nos viene a las mientes a propósito de Deleuze es que es el filósofo de lo Virtual, y la primera reacción ante eso debería ser oponer la noción de lo Virtual em Deleuze al tema omnipresente de la realidade virtual: lo que le importa a Deleuze no es la realidad virtual sino la realidad de lo virtual (que, en términos lacanianos, es lo Real). Em sí misma la Realidad Virtual es una ideia bastante miserable: la de imitar la realidad, la de reproducir su experiencia em un medio artificial. La realidad de lo Virtual, por otra parte, significa la realidad de lo Virtual como tal, de sus efectos y consecuencias reales. Consideremos un atractor em matemáticas: todas las líneas o puntos positivos que están dentro de su esfera de atracción se le aproximan de manera incesante, pero sin llegar nunca a alcanzar su forma; forma cuya existencia es puramente virtual, no outra cosa que la figura hacia la que tienden líneas y puntos. No obstante, precisamente como tal, lo virtual es lo Real de este campo: el inamovible punto focal en torno al cual circulan todos los elementos. ¿No es esto, lo Virtual, en último término, lo simbólico como tal? Tomemos la autoridad simbólica: para funcionar como una autoridad efectiva, tiene que permanecer como no-plenamente-atualizada, como una amenaza eterna. (ŽIŽEK, Organos sin Cuerpo – Sobre Deleuze y consecuencias, p. 19) 
O termo “ameaça eterna” deve ser compreendido, no contexto democrático, não como coerção panóptico-benthamiana de uma sociedade constantemente vigiada por instituições de controle disciplinar, mas como pressão sinóptica (dispersiva), fonte da irreflexão mediante a qual o consenso cidadão é construído e pseudo-legitimado a partir de seu próprio eixo de estruturação semiológica. Em poucas palavras: a democracia capitalista é o retrato do totalitarismo perfeito, porque invisível, imperceptível, inapreensível e, de conseguinte, indiagnosticável. O fato de a autoridade política não estar plasmada em um centro de poder positivo (posto que, pelo princincípio da soberania popular, é o povo – demos, populus - que se auto-governa) não descaracteriza as democracias como um regime pretensamente despótico. Isso significa apenas que o despotismo passou de um nível macromolecular para um estrato micromolecular.
Quando o absolutismo é fragmentalizado em uma multiplicidade de focos estrategicamente selecionados para exercê-lo nas instâncias parlamentar, administrativa e judiciária, seu grau de repressão e controle é hiperpotencializado, porque impulsionado em filamentos nas válvulas de uma “máquina abstrata, que:
Começa a se desdobrar, começa a se erigir, produzindo uma ilusão que transborda todos os estratos, embora pertença ainda a um determinado estrato. É, evidentemente, a ilusão constitutiva do homem (quem o homem pensa que é?). É a ilusão que deriva da sobrecodificação imanente à própria linguagem. (DELEUZE e GUATTARI, Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, vol. 1, p. 79)
A democracia é a personificação daquilo que Deleuze e Guattari chamam de singularidade zero, a dimensão neutral em cuja matriz radicular fluem imperativos de consolidação do devir, que, por sua vez, “se asienta en la fuerza productiva del “esquizo”, esta explosión del sujeto unificado em la multitud impersonal de intensidades deseantes, intensidades que son constreñidas subsiguientemente por lá matriz edípica”. (ŽIŽEK, Organos sin Cuerpo – Sobre Deleuze y consecuencias, p. 48)   
Portanto, não há se falar em uma dicotomia entre os processamentos de macromultiplicidades arborescentes e micromultiplicidades rizomáticas, uma vez que ambos figuram como desdobramentos lineares de uma interpenetração a-epistemológica do sujeito com o objeto do conhecimento. É precisamente neste interregno que a esquizomania democrática se auto-propulsiona comunicativamente através de uma linguagem codificada de “sim e não”, “lícito e ilícito”, ”justo e injusto”, etc. 
Do eixo genético ou da estrutura profunda, dizemos que eles são antes de tudo princípios de decalque, reprodutíveis ao infinito. Toda lógica da árvore é uma lógica do decalque e da reprodução. Tanto na Linguística quanto na Psicanálise, ela tem como objeto um inconsciente ele mesmo representante, cristalizado em complexos codificados, repartido sobre um eixo genético ou distribuído numa estrutura sintagmática. Ela tem como finalidade a descrição de um estado de fato, o reequilíbrio de correlações subjetivas, ou a exploração de um inconsciente já dado camuflado, nos recantos obscuros da memória e da linguagem. Ela consiste em decalcar algo que se dá já feito, a partir de uma estrutura que sobredecodifica ou de um eixo que suporta. A árvore articula e hierarquiza os decalques, os decalques são como folhas na árvore. (DELEUZE e GUATTARI, Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, vol. 1, p. 21)     
O rizoma, a outro giro, não pode ser interpretado como estrutura na estrita acepção do termo, na medida em que seu caráter cartográfico permite que seja explorado a partir de diferentes perspectivas por diferentes observadores. Portanto, a apreensão rizomática pode ser metaforicamente descrita como a leitura de um mapa: o mapa do decalque. 
O mapa não reproduz um inconsciente fechado sobre ele mesmo, ele o constrói. Ele contribui para a conexão dos campos, para o desbloqueio dos corpos sem órgãos, para sua abertura máxima sobre um plano de consistência. Ele faz parte do rizoma. O mapa é aberto, é conectável em todas as suas dimensões, desmontável, reversível, suscetível de receber modificações constantemente (...) Entretanto, será que nós não restauramos um simples dualismo opondo os mapas aos decalques, como um bom e um mal lado? (DELEUZE e GUATTARI, Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, vol. 1, pgs. 21 e 22)   
A resposta negativa para esta pergunta vem acompanhada da seguinte explicação:
O decalque já traduziu o mapa em imagem, já transformou o rizoma em raízes e radículas. Organizou, estabilizou, neutralizou as multiplicidades segundo eixos de significância e de subjetivação que são os seus. Ele gerou, estruturalizou o rizoma, e o decalque já não reproduz senão ele mesmo quando crê reproduzir outra coisa. Por isto ele é tão perigoso. Ele injeta redundâncias e as propaga. O que o decalque reproduz do mapa ou do rizoma são somente os impasses, os bloqueios, os germes de pivô ou os pontos de estruturação (...) Existem estruturas de árvore ou de raízes nos rizomas, mas, inversamente, um galho de árvore ou uma divisão de raiz podem recomeçar a brotar em um rizoma. (DELEUZE e GUATTARI, Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, vol.1, p. 22) 
  
Toda essa performance de descodificação e recodificação de estratos que se sobrepõem uns aos outros mediante interestratos para formar paraestratos é presidida por aquilo que Deleuze denomina “mecanosfera”, o organismo transcodificador (ou sobrecodificador) dentro do qual as relações de poder interagem semiologicamente através de uma espécie de metalinguagem universal (anterior à relação significante-significado). “É essa propriedade de sobrecodificação ou de sobrelinearidade que explica o fato de não haver, na linguagem, somente independência da expressão em relação ao conteúdo, mas também independência da forma de expressão em relação às substâncias”. (DELEUZE e GUATTARI, Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, vol. 1, p. 78) 
Isso suscita a formulação de um problema, que pode ser assim enunciado: Partindo do pressuposto habermasiano de que as democracias capitalistas operam por meio da linguagem e que esta linguagem está sujeita a um alto grau de risco de dissenso rumo à materialização do consenso, como interlocutores, em sua maior parte destituídos da capacidade de entender a dinâmica de processamento do regime democrático poderiam participar ativamente da construção de significados de objetos dentro deste regime? Ou, mais sucintamente: como uma metalinguagem a-significante poderia gerar significados consensuais se, mesmo entre significados e significantes não há uma simétrica correspondência, como conclui Deleuze em Mil Platôs?   
Como se percebe claramente, o problema da indagação reside antes, e acima de tudo, na impossibilidade de se formular um problema cujo objeto padece de uma sondagem no “plano de consistência” (ou planômeno), plano este que a linguagem não consegue penetrar, exceto sob a forma de desterritorialização. 
O que chamamos de mecanosfera é o conjunto das máquinas abstratas e agenciamentos maquínicos, ao mesmo tempo, fora dos estratos, nos estratos e interestráticos. O sistema dos estratos, portanto, nada tinha a ver com significante-significado, nem com infra-estrutura superestrutura, nem com matéria-espírito. Tais oposições eram maneiras de reduzir a um todos os estratos, ou então de fechar o sistema sobre si, isolando-o do plano de consistência como desestratificação. (DELEUZE e GUATTARI, Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, vol. 1, p. 88)   
O que nos torna possível identificar a mecanosfera sobrecodificadora com o regime democrático é precisamente seu duplo grau de articulação. Poderíamos, com Deleuze e Guattari, constatar que as democracias capitalistas são uma lagosta, na medida em que é, por um lado, composta por camadas de segmentos de estratos descodificadores, e, por outro, por um continuum linear que recodifica o Ecúmeno em uma linguagem metaestrática através de um complexo de máquinas abstratas e agenciamentos maquínicos intermediários. Os interlocutores envolvidos no processo político-deliberativo conhecem o primeiro lado da lagosta, mas são completamente ignorantes em relação ao segundo, porque, como ficou assente, a linguagem vai muito além da mera co-respectividade entre significante e significado. 
Destarte, se os interlocutores são incapazes de se comunicarem mediante códigos polifônicos que trazem, em sua própria estrutura recodificadora, uma infinidade de desdobramentos semânticos, é imperativo que também sejam incapazes de exercer um domínio absoluto sobre o objeto compartilhado intersubjetivamente no mundo da vida.  Ao perseguir um ideal de auto-legitimação das democracias capitalistas em que os cidadãos possam se enxergar simultaneamente como autores e destinatários das normas jurídicas, os democratas se olvidam que por trás desta fachada existe um universo de questões não respondidas e/ou problematizadas de maneira deficiente. 
O rizoma tende a se tornar cada vez mais complexo na medida em que o intérprete da realidade sócio-política vai se aprofundando no destrinchamento de aspectos filamentares de sua configuração mecanosférica. Daí ser razoável inferir que os democratas, com o afã de entenderem o funcionamento das instituições democráticas, acabaram abdicando da visão de conjunto, deixando de remeter alguns efeitos centrais a causas mais remotas ou periféricas que, aliás, não podem ser conhecidas sem que se faça menção a outros centros de outras periferias, uma vez que todo e “qualquer código [é] afetado por uma margem de descodificação” (DELEUZE e GUATTARI, Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, vol. 1, p. 67). Nas palavras de Deleuze e Guattari: “da camada central à periferia, depois do novo centro à nova periferia, passam ondas nômades ou fluxos de desterritorialização que recaem no antigo centro e se precipitam para o novo. Os epistratos se organizam no sentido de uma desterritorialização cada vez maior”. (DELEUZE e GUATTARI, Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, vol. 1, p. 67)
Nesse diapasão, quando Habermas aduz que os argumentos veiculam pretensões de validade binária por envolverem a tomada de decisão em termos de sim ou não, ele o faz pegando de empréstimo postulações linguísticas que são de per se defeituosas por pressuporem a inequivocidade da correlação entre significante e significado, o que, consoante ficou assente, não se verifica, porque os códigos linguísticos carregam um potencial descodificador em seu próprio arcabouço semântico. Se, por um lado, podemos dizer que as democracias capitalistas possuem um caráter rizomórfico por operarem a partir de uma justaposição de estratos vocacionados para a estruturação do Ecúmeno, por outro é lícito constatar que, em instância mecanosférica, os metaestratos retiram a linguagem do domínio dos interlocutores, impossibilitando a atribuição de significados a objetos indeterminados. 
Poder-se-ia contra-argumentar, com Habermas e Bobbio, que a atribuição de significados a objetos tem a ver mais com as “regras do jogo” consensualmente estabelecidas pelos participantes da experiência comunicativa do que com o propósito linguístico dos atos de fala orientados para fins de esclarecimento. Mas isso só reforçaria a tese de que o sentido das democracias contemporâneas se esgota em uma assimilação do real por aparelhos virtuais de sobrecodificação nos labirintos rizomórficos do esquizo. Se a psicologia define como loucas pessoas inconscientes de seu estado de loucura, podemos deduzir, por analogia, que os democratas são esquizofrênicos pelo simples fato de desconhecerem a realidade que eles tão apaixonadamente alegam defender. 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De todo o acima exposto, conclui-se que a universalibilidade e indeterminabilidade de conceitos como “direitos humanos” e “democracia” têm servido para a legitimação de reiteradas atrocidades no marco de uma pós-modernidade veladamente totalitária, tendência que já havia sido diagnosticada por pensadores da envergadura de Alain de Benoist, Alasdair MacIntyre, Alexandr Dugin e por toda a plêiade de tradicionalistas em sentido estrito, cujo pensamento constitui importante contra-ataque às postulações habermasianas e ao engessamento de discussões acadêmicas nos circuitos institucionais “democráticos”. 
Se, por um lado, o inatismo dos direitos humanos legado ao ocidente pelo século das luzes erige-se como blindagem de hiperpotências globalistas em instância transnacional, a tese que preconiza a existência de um Estado de Direito pretensamente democrático, por outro, vem surtindo efeito análogo em seara nacional. Juntos, funcionam como instrumentos hábeis a garantir a incolumidade da hegemonia pós-liberal na plataforma geopolítica de uma ocidentalidade cada vez mais fragilizada em termos políticos, espirituais, filosóficos e existenciais.
Pode-se, sem exagero, predizer que o ocidente se auto-aniquilará a partir de seus próprios mecanismos de articulação, que operam em nível sub-molecular; e, quando todas as possibilidades de reversão deste quadro catastrófico houverem esgotado, a civilização ocidental já não poderá recorrer ao materialismo, ao humanismo e à razão cartesiana para perpetuar sua auto-legitimação através das eras, tampouco lhe será possível utilizar inimigos externos como bodes expiatórios para a reiteração do seu fracasso ontológico. Ninguém precisará mover uma palha para derrubar as democracias e os direitos humanos de seu pedestal, posto que eles próprios se encarregarão de tal mister.
Destarte, o que era para ser uma guerra de trincheiras entre pólos antagônicos se converte paradoxalmente na neutralização autofágica de um organismo pretensamente superior à própria história, que terminará, mais cedo ou mais tarde, sendo engolido por ela. 
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(1) De Benoist, ALAIN. Para Além dos Direitos Humanos. Editora Austral, Porto Alegre, 2013. (2)Idem. 
(3)Idem. 
(4)Idem
(5)Sources of the Self: The Making of Modern Identity, Harvard University Press
(6)Kant, IMMANUEL. Crítica da Razão Pura, Livro II, Cap 2, Editora Vozes. 
(7)De Benoist, ALAIN. Para Além dos Direitos Humanos. Editora Austral, Porto Alegre, 2013. 
(8)Idem. 
(9)De Maistre, JOSEPH. Considerações sobre França, Editora Almeida. 
(10)MacIntyre, ALASDAIR. Depois da Virtude: um estudo em teoria moral. Editora EDUSC. 
(11)Idem. 
(12)Idem. 
(13)Idem. 
(14)Idem. 
(15)Ibidem. 
(16)Idem. 
(17)Idem. 
REFERÊNCIAS BIBLIOGFRÁFICAS
DE BENOIST, Alain. Para Além dos Direitos Humanos. Editora Austral: Porto Alegre, 2013.
TAYLOR, Charles. Sources of the Self: The Making of Modern Identity. Harvard University Press.
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SCHMITT, Carl. O Conceito do Político. Petrópolis: Vozes, 1992.
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HABERMAS, Jürgen. A Inclusão do Outro – estudos de teoria política. Edições Loyola: São Paulo, 2002.
ŽIŽEK, Slavoj. Bem-Vindo ao Deserto do Real. Boitempo Editorial: São Paulo, 2003.
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EVOLA, Julius. Revolta Contra o Mundo Moderno. Publicações Dom Quixote: Lisboa, 1989.
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AGAMBEN, Giorgio. O Que é o Contemporâneo. Argos: Chapecó, 2009.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix. Mil Platôs – Capitalismo e Esquizofrenia, vol. 1. Editora 34: São Paulo, 1995.

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